Nós e a Morte, Segundo Freud
*Juarez Chagas
“Nós criaturas civilizadas tendemos a ignorar a morte como parte da vida...no fundo ninguém acredita na própria morte, nem consegue imaginá-la. Uma convenção inexplícita faz tratar com reservas a morte do próximo. Enfatizamos sempre o acaso: acidente, infecção, etc., num esforço de subtrair o caráter necessário da morte. Essa desatenção empobrece a vida...”.
O texto acima é de Sigmund Freud e é a introdução de sua palestra intitulada “Nós e a Morte”, proferida em 1916, a qual faz parte de sua obra “Considerações atuais sobre a Guerra e a Morte”, onde o psicanalista apresenta ao mundo científico da época, sua visão sobre a finitude humana e como ela deveria ser encarada por cada um de nós.
O texto de Freud tem a capacidade de nos conduzir a algumas reflexões nada rotineiras ou prazerosas, mas que todo ser consciente deveria fazer, porém no entanto, normalmente fugimos delas (reflexões).
Quem leu o trabalho de Freud “Nós e a Morte”, o qual originou-se de um ciclo de palestras proferido pelo mesmo em 1915, percebe que sua preocupação com a questão da morte tem base não apenas no declínio da condição biológica, mas também fortemente calcada na questão da guerra e sua capacidade destrutiva além da morte, algo que o afetou muito particularmente! Ele reporta-se, categoricamente, sobre o ato do homem matar seu inimigo desde sua época mais primitiva aos dias atuais, havendo um ponto comum entre o homem primitivo e o civilizado, no que diz respeito ao desejo de destruir quem o ameaça ou lhe oferece perigo, pois a consciência de que a guerra põe fim à atitude convencional ante a morte é planejada.
Interessante é que Freud diz que nosso inconsciente comporta-se de maneira semelhante ao do homem primitivo, pois este inconscientemente não acredita na própria morte, apesar de vê-la rondando e de abater seu próximo, constantemente. Por outro lado, sabemos que o consciente, como era de se esperar, apavora-se com a idéia da morte e, portanto, está aí gerado o conflito existencial. A propósito, Freud chama a atenção de que nossa atitude civilizada perante à morte é muito irreal e que “vivemos psicologicamente acima de nossos meios”, enquanto deveríamos conceder um espaço maior em nossas vidas para a morte, para que a vida se tornasse suportável conscientemente, embora sabendo de sua finitude e de suas conseqüências.
No meio de toda essa fantástica abordagem de Freud, me chama a atenção o fato dele se referir a “atitude civilizada” do homem frente à morte, mais de uma vez, como se admitisse ser uma obrigação para o homem moderno lidar melhor com sua terminalidade. É claro que fica evidente a comparação que o mesmo faz entre a maneira de encarar a morte e a guerra entre o homem primitivo e o homem civilizado, no entanto, observando a evolução humana através dos tempos, percebemos que a aceitação da morte como sendo parte da vida ou o fim desta, não avançou como deveria. É interessante observar que quanto mais moderno o homem, mais modernas suas guerras e suas mortes.
E sabido, não somente por causa da doença que o combalia, o definhava e o irritava cada vez mais, nos última anos de sua vida, mas também por cada vez mais admitir ser a finitude a última companheira do homem, que Freud defendia a idéia de que viver eternamente seria o maior fardo que o ser humano carregaria, se possível fosse. E isso não estava no seu inconsciente.
* Professor do Centro de Biociência da UFRN (Juarez@cb.ufrn.br)
19 de mar. de 2009
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2 comentários:
"...viver eternamente seria o maior fardo que o ser humano carregaria."
Definitivamente, esta é uma grande verdade...e ,de repente, a beleza da vida reside em sua finitude e na impossibilidade de se prever o exato momento do fim...
Bom texto Juarez. abçs
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