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18 de dez. de 2009

ENTÃO É NATAL

Então é Natal...
* Juarez Chagas

Lennon era um gênio pacifista porque esse conteúdo já fazia parte do seu eu e de sua subjetividade e, talvez, por isso seja considerado um dos maiores ícones do século XX. Mesmo tendo tido uma infância muito difícil e complicada e, abandonado pela mãe e criado por uma tia, Lennon superou os problemas da infância e adolescência com arte e música, saindo para o mundo através delas.

Os Beatles apresentou Lennon ao mundo, mas não foi somente a banda que o fez famoso e sim, sua capacidade, inteligência e, acima de tudo, sensibilidade e amor pelo ser humano que, contraditória e maldosamente, o assassinou, provando que a natureza humana é uma dualidade do bem e do mal ou, apenas um desses dois, quando bem ou mal escolhido.

Na época da jornada dos Beatles, Lennon formou com Paul McCartney uma das mais famosas duplas de compositores de todos os tempos, a dupla Lennon/McCartney, tipo a dobradinha Roberto Carlos/Erasmos Carlos, apenas dando um exemplo em menores proporções. Entretanto, quando os Beatles se separaram, Lennon pode mostrar mais ainda sua capacidade criativa, e cantando verdadeiras pérolas musicais que sempre permearam entre os temas amor, guerra, paz e o valor da pessoa humana.

Quando a maior e mais famosa banda de rock do mundo brindava os jovens, adultos, enfim, fãs em todo o planeta com suas marcantes canções, apologias ao amor eram praticamente uma mistura de protesto e romantismo, como podemos ver em All You Need Is Love, por exemplo, os quatro cabeludos de Liverpool, inspiravam paz, amor, rebeldia e uma nova forma de contestar o stablishement. Assim, a sociedade jovem dos anos 60 e 70 jamais seria a mesma depois dos Beatles e Rollings Stones. Muito embora, admitamos que uma revolução, seja de que forma e ideal forem, é sempre plantada, no mínimo uma década antes de sua explosão. Tem sido assim, nas artes, ciências e religiões, pois sempre se colhe depois o que se planta antes. É uma lei natural.

Em sua carreira solo, Lennon pôde imprimir mais ainda essa vertente, como fez com Imagine, I Don`t Want To Be A Soldier, Give Peace a Chance, Happy Xmas (War is Over) e outras canções do gênero, tendo sido estas duas últimas lançadas no mesmo álbum de 1975. Agora, o mundo todo cantava Lennon, cantava a paz., cantava o amor.

Sobre "Happy Xmas (War Is Over)" é uma canção natalina que Lennon vez com Yoko Ono e sua banda Plastic Ono Band, gravada no Record Plant Studios, em Nova York, em outubro de 1971. O back vocal é feito pelas crianças que compunham o Côro da Comunidade de Harlem e, na verdade, a música é um protesto contra a guerra do Vietnam, o que fica bem claro no côro final da melodia, como se o fim da guerra fosse o melhor presente para a humanidade. E é nessa mistura de conteúdos que se pode ver um pouco da genialidade de Lennon.
Particularmente, com todo respeito e reconhecimento conquistado por Paul McCartney, eu acho que se a dupla compositora dos Beatles fosse Lennon/Harrison, teria sido muito mais rica, pois nao minha opinião, George Harrison, além de um dos melhores guitarristas do mundo, foi tao genial quanto John Lennon (Mas, isso, evidentemente, é apenas uma opinião pessoal).

Assim sendo, entregando-me ao espírito festivo de Natal e Ano Novo, gostaria de desejar a todos os nossos amigos, leitores e leitoras, às famílias e às pessoas de todo o mundo um Feliz Natal, um Feliz Ano Novo, lembrando a canção Feliz Natal (A Guerra acabou), de John Lennon (Traduzi a música de acordo com sua letra original e não como mostra a versão brasileira, a qual se acha adaptada à canção original em alguns trechos), para que tenhamos um mundo melhor com mais amor e paz entre as pessoas.

So this is Xmas (Entao é Natal)
And what have you done (e o que você tem feito)
Another year over (Mais um ano que termina)
And New one Just begun (e um novo ano já começa)

And so Happy Christmas (Então Feliz Natal)
I hope you have fun (Desejo que você se divirta)
The near and the dear one (o próximo e os entes queridos)
The old and the young (O velho e o novo)

A very Merry Christmas (Um Natal muito feliz)
And a Happy New Year (E um Feliz Ano Novo)
Let´s hope it`s a good one (Vamos esperar que seja um bom Ano)
Without any fear (Sem qualquer medo)

And So this Christmas (E então é Natal)
For weak and for strong (para o fraco e para o forte)
For rich and poor ones (Para o rico e para os pobres)
The World is so wrong (O mundo é tão errado)

And so Happy Xmas (E então Feliz Natal)
For black and for white (Para o preto e para o branco)
For red and yellow ones (Para vermelhos e amarelos)
Let´s stop all the fight (Acabemos com toda a luta)

A very Merry Christmas (Um Natal muito feliz)
And a Happy New Year (E um Feliz Ano Novo)
Let´s hope it`s a good one (Vamos esperar que seja um bom Ano)
Without any fear (Sem qualquer medo)

War is over (A Guerra acabou)
If you want it (Se voce quiser)
Now (Agora)
* Professor do Centro de Biociências da UFRN

26 de nov. de 2009

“ERA UMA VEZ...”

Caros leitores, caras leitoras e visitantes do meu blog. Foi muito gratificante, muito solidário e feliz o lançamento do livro “Letras e Imagens do BEM" (Vol 4), do nosso amigo Jornalista, escritor, Alma Elevada (como eu o chamo) e um dos defensores do Planeta, no início de Novembro deste Ano, no Natal Shopping.

O lançamento coletivo, deste livro, cuja renda destina-se às Ações Comunitárias da Casa do Bem, outro magnífico projeto idealizado por esta Alma Elevada que é FR, contou com a presença da maioria dos 32 escritores colaboradores, dentre os quais eu me incluo. Foi uma bela festa de confraternização, simplicidade e encontro de amigos, em prol da mais bela causa humana que é contribuir para o bem do próximo, desprovido de cobranças e interesses pessoais.

A seguir, meu texto, intitulado “ERA UMA VEZ...”, escrito especialmente para este livro(escrevi o texto no primeiro semestre deste ano, em Lisboa quando, mesmo em temporada acadêmica na aconchegante capital lusitana, sentia saudade de nossa bela e incomparável Natal) dentro de sua filosofia literária e com o pensamento exclusivo de que o bem sempre vence e prevalece.
Vale a pena adquirir o livro e ler os 32 Cavaleiros do Apocalipse (as amazonas estao incluídas, claro) nessa caminhada literária em prol do Bem e ajude as Crianças do Bem de hoje, Adultos do Bem de amanhã. Menos mal no Planeta!
(Na foto o fotógrafo do livro Esdras Nobre, Eu, FR e a jornalista e escritora Waleska Maux)

Em tempo: para as pessoas que têem visitado meu blog e indagam aonde encontrar meu livro O CORPO OCULTO, o mesmo pode ser ainda encontrado na Livraria Siciliano (Natal Shopping) e Livraria do Campus Universitário.

Era uma vez…
* Juarez Chagas

Era vez uma vez, uma história difícil de se acreditar, mas que, pelas forças dos mistérios da Natureza e por todos os desígnios que há em lugares que inspiram mistérios e magias, e nem que tenha sido na imaginação do autor e do leitor, na verdade, ocorreu, pois tudo, no universo conspirou para que assim tivesse acontecido.

Difícil de acreditar, em primeiro lugar, porque é uma história feliz e do bem, a qual, numa possibilidade quase única, não encontrou o mal em seu caminho para atrapalhar, quebrando assim todos os percursos normais da natureza, tanto cósmica quanto humana, onde o bem e mal andam lado a lado e frente-à-frente, numa guerra sem fim. Mas, como que para se provar que a exceção confirma a regra, desta vez aconteceu que foi só o bem, do começo ao fim...e, sabe-se lá em quantos milhões de anos poderá assim de novo ocorrer!
Há muitos e muitos anos, quatro amigos que, por força do Destino, se conheceram em situações e condições adversas. Conviveram juntos durante todo o período de adolescência e depois se separaram, somente voltando a se encontrar muito e muito tempo, depois.
Eles nasceram e cresceram em “Natal Encantada”, uma pequena e longínqua cidade brasileira, inspirada na Cidade dos Reis Magos, a verdadeira Natal, também conhecida como a Cidade do Sol, onde dizem, haver o ar mais puro do planeta!
Acontece que, historiadores de todo o mundo passaram a se perguntar quem surgiu primeiro, Natal Encantada ou Natal, a Cidade do Sol, pois pairavam dúvidas sobre quem havia inspirado quem. Bem, esse detalhe não prejudica a história...portanto, deixando as dúvidas históricas e lendárias de lado, continuemos a trajetória dos quatro amigos.
Aconteceu que eles, inicialmente não eram amigos, apesar de viverem quase uns de frente para o outro, pois suas casas formavam um grande triângulo visual no meio da rua de cuja área, portava-se um imponente Baobá de 30 metros de altura, por quase 10 metros de largura! Um fato grandioso e de orgulho para a pequena e pacata cidade.
Freddy, um garoto avermelhado e alto para sua idade de 14 anos, era filho de um empresário que tinha uma padaria e uma fábrica de sabão. Ninguém entendia a relação entre um negócio e outro, a não ser uma próspera forma de “fazer dinheiro”. Miro, um garoto sonhador, mais ou menos da mesma idade, cujos ancestrais tinham sido ricos comerciantes, mas que via, no momento os pais reclamarem da dificuldade que pessoas da classe média baixa, enfrentavam para viver digna e modestamente. Poty, por sua vez, era um garoto forte, alegre e obstinado, filho de pais pobres, vindos do interior para matricular o filho em Natal Encantada, onde havia o melhor e mais antigo colégio público do Brasil, outra particularidade que tornava o lugar especial e motivo de orgulho. O quarto amigo, não morava no centro da rua onde o Baobá imperava, mas às margens da praia próximo ao farol de Mater Lucia, como era conhecido, por ter o mesmo nome do bairro pobre e por, do alto das dunas, orientar as embarcações que se aproximavam da costa marítima.
O imenso Baobá não era apenas orgulho da pequena cidade, principalmente daqueles que viviam ao seu redor, mas especialmente ponto de encontro da meninada e jovens que se reuniam sob sua copa para brincarem e, se aventurarem a nele subir (tarefa esta praticamente impossível), sob o protesto dos pais.
Os quatro garotos, apesar de serem vizinhos e estudarem no mesmo colégio, freqüentavam classes diferentes e não haviam travado amizade até o dia em que algo marcante aconteceu entre eles e que os uniu para sempre.
Numa certa tarde ensolarada, quando muitos garotos jogavam bola embaixo do Baobá, de repente surge um touro louco, espumando saliva, soltando vento pelas narinas e ameaçado quem estivesse à sua frente. A gritaria foi imensa. Portas e janelas se fechavam. Mães gritavam por seus filhos mandando-os correr e voltarem para casa, pois o louco animal havia fugido em disparada, pois soltara-se de suas amarras e era conhecido por atacar e matar pessoas caso as encontrasse pela frente!
Quase todos os garotos conseguiram escapar às pressas e se esconderem aonde puderam. Mas, com o pânico e tumulto Freddy e Miro foram atropelados pelos colegas e caídos no chão, não conseguiam se mover com a velocidade necessária para fugirem antes que o touro lhes alcançasse, e pudesse espetar-lhes com seus pontiagudos chifres e pisotear-lhes furiosamente. Vendo isso, Poty que tinha conseguido escalar o Baobá, sem que ele mesmo soubesse como, apavorou-se ao ver que seus colegas e vizinhos iam ser mortos impiedosamente, pelo touro em fúria.
A rua deserta, nenhuma porta ou janela aberta e nenhum socorro surgia para debelar o animal tomado pelo instinto assassino. Os pares de olhos apavorados dos garotos não refletiam nem a metade do verdadeiro perigo e pavor de morte que deles se aproximava. Poty, num ato de bravura e, ao mesmo tempo desespero, saltou do galho do Baobá e, assim que caiu no chão, levantando-se como um gato, correu em direção ao touro enfurecido que, já bem próximo dos garotos caídos, riscava o chão como num freio repentino, sapateava jogando pedaços de terra para todos os lados e, mirando Poty de repente, o fez do mesmo, seu novo alvo. Nesse momento, Freddy e Miro, com tremendo esforço conseguem se levantar e, cambaleando com dificuldade, chegam à varanda de sua casa, esbaforidos e com o coração quase saltando pela boca. Os dois garotos sentiam um misto de alívio e remorso ao mesmo tempo, pois conseguiram escapar, mas viam seu salvador à beira da morte.
Enquanto isso, Poty, num golpe de sorte, consegue enganar o touro, circulando o tronco do Boabá e, novamente escalando o mesmo, retorna ao galho onde havia subido anteriormente. O touro louco, não mais encontrando sua suposta presa, evadiu-se, tendo sido depois capturado por homens da guarda local. Felizmente, o perigo havia passado para todos e, nada além do susto e do pânico pela sobrevivência, havia ficado em cada um.
A partir desse dia, os quatro garotos criaram uma amizade inseparável e, como em toda fiel e boa amizade, passaram a dividir sonhos e realidade. Eram vistos, a partir de então sempre juntos e, eles, como num pacto entre si, no mínimo uma vez por semana se reuniam nos galhos do Baobá para dividirem seus sonhos e amizade.
- Quando eu crescer, vou herdar a fábrica e a padaria de meu pai e, talvez, além disso, seja um famoso político. Dizia aos amigos, Freddy todo orgulhoso de si.
- Quando eu crescer, talvez funde uma grande escola para as crianças do Bairro Mater Lucia, pois lá vivem crianças e jovens que mal têm o que comer. Dizia Miro, olhando as dunas e o farol ao longe, onde crianças carentes viviam praticamente isoladas.
- Quando eu crescer, me bastará um barco a motor para ir por todo o rio e evitar que matem os peixes com a poluição. Dizia Poty, satisfeito olhando o grande Rio dos Camarões, que cortava a pequena cidade ao longo de sua extensão e desembocava no mar.
- E você, o que fará quando crescer? Perguntavam os três ao quarto amigo que igualmente dividia os galhos do Boaboá.
- Não sei ainda. Muita coisa ainda há por vir até eu me decidir. Dizia ele.
Aconteceu que, o progresso selvagem chegara à pequena Natal Encantada e muita coisa mudara. Os quatro amigos terminaram os estudos secundários e, finalmente, os universitários e, mais uma vez, por força do Destino, cada um tomou seu rumo.
Freddy tornou-se um grande empresário e político numa cidade do Sul do país. Miro tornou-se um famoso editor de jornal, porém nunca conseguiu, por livre escolha, transformar as oportunidades que lhes surgiram e bateram-lhe à porta, em riqueza material, mas seu sonho estava quase realizado, pois estava prestes a fundar uma importante escola para as crianças do bairro Mater Lucia. Poty, por sua vez, eventualmente era visto subindo e descendo o Rio dos Camarões, em sua bela embarcação, um barco-escola, pois fundara um negócio na área de turismo ecológico, onde podia ajudar as pessoas a pensarem ecologicamente correto. Do quarto amigo, não mais souberam. Uns diziam que tinha ido fazer pós-graduação no exterior; outros falavam que havia se tornando um respeitável médico em outro Estado. Mas, entre uma dúvida e outra, ele permanecia no anonimato.

Assim sendo, depois de muito tempo, mais uma vez, como no início da história, pelas forças dos mistérios da Natureza e por todos os desígnios que há em lugares que inspiram mistérios e magias, num belo mês ensolarado, o prefeito da cidade, convida ilustres pessoas locais para um importante evento: o tombamento do Baobá como acervo e patrimônio universal, alegando entre outras razões inteiramente justificáveis que, até na história de O Pequeno Príncipe, Antoine de Saint-Exupéry, que teria estado na Natal Encantada e por isso narra, em seu livro que o solo de seu pequeno asteróide era infestado de sementes de Baobá e, que portanto a árvore era também conhecida mundialmente.
Aconteceu que, no dia do ato solene, ao meio de uma considerável multidão, o prefeito, em seu discurso emocionado, saúda e convoca ao palco de recepção, três homens cuja história de vida passou a ser orgulho incontestável para a pequena Natal Encantada. O anúncio dos nomes, pelo chefe de cerimônia, fizeram subir ao palco, Freddy, Miro e Poty que, sob salvas de palmas e urras, tomaram, felizes e emocionados, seus assentos.
Freddy, dizia em seu histórico lido, foi o político mais honesto que o país conheceu até hoje e, sua luta e projetos colocaram sua cidade Natal no cenário nacional, tendo também o Baobá como um dos símbolos da cidade, portanto filho prodígio do lugar. Poty, ficou conhecido como o defensor do Rio dos Camarões, com sua empresa ecológica, um dos maiores exemplos a ser seguido. Miro foi enaltecido como o fundador da Escola Solidária de Mater Lucia, um projeto social que conquistou o país inteiro. As palmas aos três amigos emocionaram a todos os presentes que sentiam orgulho dos filhos da terra.
Foi o encontro mais emocionante que já se viu entre amigos de infância que, na verdade é impossível descrever com palavras. É importante dizer que, em um dado momento, no palco da cerimônia montado em baixo do Baobá, sem que o público percebesse, como numa transmissão de pensamento e com a mesma intenção, os três amigos entreolharam-se e, sorrindo, olharam para cima da árvore e, fixando o mesmo galho onde costumavam se reunir para falar de seus sonhos, e certamente, sentiram-se crianças.
Na verdade, é preciso entender que, para se olhar para cima é necessário estar no chão, mas com a determinação de que se pode chegar no alto. E foi aonde eles chegaram, mostrando que cada um de nós deve lutar por seu sonho, praticando sempre o bem.
Como eu disse no início, esta é uma história feliz e que começou e terminou feliz. Mas, você deve estar perguntando pelo quarto amigo, do qual nunca mais ninguém ouviu falar. O que eu posso dizer é que, ele estava também presente na multidão, indo ter com os três amigos cuja alegria ao vê-lo não cabia em si. E, ainda como uma honra à parte, foi ele quem, emocionado escreveu e narrou esta história do bem !

* Psicólogo e escritor (autor de O Corpo Oculto).

7 de set. de 2009

SOBRE O LIVRO "O CORPO OCULTO"


O Corpo Oculto
*Juarez Chagas

Receber elogios e críticas sobre seu trabalho significa estímulo e reconhecimento, muito embora, às vezes, haja exagero de um lado ou de outro. Porem, receber elogios de amigos que acompanham seu trabalho de perto, é algo mais significativo ainda. Por essa razão, transcrevo, na integra, o comentário de meu amigo Carlos Sizenando, professor da UFRN e também escritor que, embora tenha exagerado no elogio, merece o registro:
Sobre o livro de Juarez Chagas: O Corpo Oculto.

“Sem pressa para não engasgar, degustei cada molécula do seu “O Corpo Oculto” e adianto que tem potencial para chegar às telas do cinema.

Como um autêntico diretor e roteirista de filme noir, você tem todos os personagens na mão. Mergulha na mente de cada um deles, expressa seus sentimentos com maestria e, como “um vento forte que surge de repente” simultaneamente já conduz à cena seguinte. Constrói pouco a pouco, uma teia aparentemente desconexa, convidando e já nos transformando em personagem coadjuvante. Sim, porque somos instigados a imaginar saídas para que o bem vença o mal.

Como nos grandes clássicos de ficção da literatura, você é detalhista e perfeccionista: nos convence que Bela Vista e Rio Azul são reais; nos envolve ao som da belíssima Vozes da Primavera, a valsa Opus 410; nos faz sentir no osso o frio de uma noite sombria. Nos mutila o corpo e nos faz apaixonados no momento seguinte.

Esta obra é quase uma autobiografia, uma vez que de alguma forma você lembra o menino que ouvia Jerônimo, desenhava e colecionava histórias em quadrinhos. Comia pipoca enquanto os olhos brilhavam diante dos trapezistas no espetáculo circense na Praça Tamandaré. Prestigia as artes marciais de Bruce Lee com efeitos especiais de Matrix e X Man. Contorna a rebeldia de James Dean e o Pop-Rock de Bob Dylan. Passeia sutilmente pela SCBEU, reverencia os grandes nomes precursores das anatomias humana e comparada. Caminha pelos corredores, contempla quadros e fotos em preto e branco das turmas do nosso CB/UFRN. Brinca de esconde-esconde com a morte, numa combinação de Tanatologia, Ghost, espiritismo e Love Story. E chega, finalmente, a sua fase psicológica, vivenciando dramas existenciais de seus personagens. Tudo isso reunido coerentemente num formato ágil entre o seriado 24horas (Jack Bauer – em tempo real) e Edgar Allan Poe.

O clima e paisagens européias sugerem suas andanças por terras lusitanas. E mesmo que você não compartilhe o rótulo de poeta, a leveza como escreve é poesia pura, recheada de toques de classe, como em “Pitágoras (...) finge estar limpando o quadro de Rembrandt”. Genial.

Confesso que às vezes confundi os nomes de Stanley com Spencer. E ainda Celine com Clarice. É verdade que em algum momento o sangue respingou em mim. Imaginei que o delegado fosse desvendar algum mistério no plano terráqueo. Mas o melhor ficou para o fim.

Sabe aquela situação em que nós professores estamos corrigindo a prova de um aluno aplicado, que vem acertando todas as questões – você torcendo por ele – e no final ele erra a última? Ou um filme legal cujo final lhe decepciona? Pois bem, você me criou uma grande expectativa e eu temi que o desfecho final não estivesse à altura. Pois foi exatamente aí que, definitivamente, você revelou todo o talento de um escritor completo.

E se alguém duvida como um escritor foi capaz de reunir tantas variáveis em uma aventura romântico-ficcionista, Sherlock Holmes certamente responderia: “Elementar, meu caro Watson, isto é obra de Juarez Chagas!”. (Carlos S.R.Pinheiro)”.
* Professor do Centro de Biociências da UFRN

6 de ago. de 2009

ELIZABETH KLÜBER-ROSS

Klüber-Ross
*Juarez Chagas

Falar, nos dias de hoje, sobre a finitude humana, seus cuidados e suas conseqüências biopsicossociais e não mencionar Elizabeth Klüber-Ross (Zurique/Suíça 1926 - Arizona/EUA 2004) como uma das principais referencia contemporânea, é no mínimo um grave descaso. Antigamente, quando se abordava questões sobre o mesmo tema, ninguém o fazia sem antes citar Schopenhauer, Durkeheim, Foucault, Freud e tantos outros, isso sem falar nos filósofos como Platão, Epicuro e, tantos outros, igualmente. Klüber-Ross tinha a Medicina como sonho e passou mais de três décadas fazendo pesquisa sobre a morte e o morrer, divulgando seus trabalhos, principalmente na Europa e Estados Unidos, onde morreu aos 78 anos de idade.

É importante dizer que Klüber-Ross vivia num “centro de uma controvérsia medica e teológica”, como ela mesma costumava dizer. Essa controvérsia, iria se evidenciar mais enfaticamente durante os últimos anos de sua vida, quando passou a afirmar que a morte não existe. Entretanto, a rica trajetória e experiência dessa pequena mulher obstinada (eu diria, fazendo uma analogia ao personagem de Dustin Hofman no filme O Pequeno Grande Homen, ter sido ela The Little Big Woman da Medicina) nos deixou um legado inestimável e, sobretudo, um exemplo a seguir no que se refere `as atitudes perante a morte.

Mas, para chegar ate aonde chegou, principalmente explorando e divulgando um assunto tão árido quanto assustador, encapuzado pelo tabu da ignorância e pavor social, Klüber-Ross quebrou barreiras, preconceitos, obstáculos e, principalmente, descaso de homens e instituições. Mas ela guardava em si uma das mais fortes e nobres qualidades do ser humano perante os óbices: a persistência e crença no que se propunha. É dela a frase que costumava dizer a si mesma quando queria fraquejar: “As adversidades somente nos tornam mais fortes, pois não há alegria sem dificuldades, não existe prazer sem dor”.

Quem leu seu ultimo livro, A Roda da Vida, o qual alem de seu trabalho e pesquisas, também nos remete quase a uma biografia pessoal, surpreende-se claramente ao perceber que ela era uma medica tão humana que sofria com e pelos pacientes, rezava e chorava com eles quando não tinha outro jeito e, nem por isso, tornou-se menos medica. Muito pelo contrario, valorizou, principalmente, o paciente terminal, cuja esperança seria morrer melhor acolhido, como um ser humano, com a identidade com a qual viveu durante toda sua vida.

E interessante frisar que Klüber-Ross teve inúmeros problemas ate conseguir ser um novo modelo na medicina no que diz respeito ao cuidar do paciente, pois enfrentou o descrédito de seus colegas de medicina quando se dedicou a entender o fenômeno do "morrer" em pacientes terminais. Submetendo-se ao ridículo quando orava junto a seus pacientes que lhe solicitavam. E a pergunta que mais ouvia nos corredores dos hospitais era: como pode uma profissional treinada para salvar vidas destinar seu tempo com aqueles com quem cuja vida se esvai, sem qualquer chance de devolvê-la?

Sua resposta viria mais tarde com o sofrimento e com o tempo, pois foi experenciando o morrer de seus pacientes que foi capaz de descrever em seu livro "Sobre a morte e o morrer", os principais estágios pelos quais passavam seus pacientes. Na verdade, através de sua forma humana de ser e atuar, teve a coragem de quebrar padrões e tradições estigmatizadas ao longo do tempo pela sociedade e imprimir uma revolucionaria forma de humanização no atendimento e cuidado do paciente, especialmente o paciente terminal, cuja esperança final reside no acolhimento da família e amigos, em seus últimos dias de vida.

Sobre uma importante experiência e lição que ela teve com uma faxineira de um hospital onde trabalhou, costumava dizer que “Nenhuma teoria ou ciência do mundo ajuda tanto uma pessoa quanto um outro ser humano que não tem medo de abrir o coração para seu semelhante”. Nesse hospital ela observou que esta faxineira conversava com seus pacientes terminais e, percebeu que quando a faxineira saía, os pacientes se sentiam mais animados e apresentavam atitudes mais otimistas. Começava aí a passos firmes de sua trajetória do entendimento e o estudo sobre a morte e o morrer que, posteriormente, viria a ser conhecido como Tanatologia.

Mas, essa fase seria apenas a base de seus estudos, pois viria muita coisa pela frente, assim como, muitos obstáculos também a serem enfrentados e vencidos. Aos poucos a experiência ganhava um sentido acadêmico único que somente a Dra. Klüber-Ross experienciava naquele momento. Ela via nitidamente que todos os seus pacientes terminais e, igualmente, todas as pessoas que sofrem uma perda, passavam por estágios semelhantes. Surgiam assim os cinco estágios (posteriormente conhecido como Modelo Klüber-Ross) através dos quais as pessoas passam ao lidar com a perda, o luto e a tragédia, segundo suas observações: 1. Negação (isolamento); 2. Cólera (raiva); 3. Negociação (barganha); 4. Depressão (reação ao conflito); 5. Aceitação (resignação).

Klüber-Ross, pode ser considerada hoje a mulher e médica que mudou a maneira como o mundo cientifico via e pensava sobre a morte e o morrer e este modelo se popularizou e se tornou conhecido como “Os Cinco Estágios do Luto ou da Dor da Morte ou da Perspectiva da Morte , encontra-se detalhadamente descrito no livro da autora intitulado A Roda da Vida – Memórias do viver e do morrer (The Wheel of Life - 1997 - Ed. Sextante - 313p), fonte imprescindível para quem busca um melhor entendimento para a questão da finitude humana, especialmente para profissionais da área. Cada um desses estágios, hoje muito bem aceitos pelos profissionais da saúde que cuidam, especialmente de pacientes terminais e idosos que se sentem desiludidos com a vida, tem um significado especial e nem sempre segue a mesma seqüência.

Gostaria de transcrever um texto do próprio livro de Klüber-Ross, tal qual ela expressa sua visão e sentimento sobre o obstáculo de enfrentar a morte e como a medicina tem esquecido essa realidade, ao longo do tempo:
“Talvez o maior obstáculo a enfrentar quando se procura compreender a morte seja o fato de que é impossível para o inconsciente imaginar um fim para sua própria vida. O inconsciente só é capaz de compreender a morte sob uma perspectiva: uma súbita e assustadora interrupção da vida por meio de uma morte trágica, um assassinato ou uma das muitas doenças horríveis que existem. Na mente de um médico, a morte significa outra coisa. Significa colapso, falência, declínio. Eu não podia deixar de observar como todos no hospital evitavam o assunto.

Naquele hospital moderno, a morte era um acontecimento triste, solitário e impessoal. Os pacientes terminais eram encaminhados para os quartos dos fundos. Na sala de emergência, os pacientes ficavam em total isolamento, enquanto médicos e parentes discutiam se deveriam ou não contar a eles o que havia de errado. Para mim, havia sempre uma única pergunta que precisava ser feita: “De que modo vamos todos, nós e ele, compartilhar essa informação?” Se alguém me perguntasse qual é a situação ideal para um paciente que vai morrer, eu voltaria à minha infância e descreveria a morte do fazendeiro que foi para casa morrer junta da família e dos amigos. A verdade é sempre a melhor opção.

Os grandes avanços da medicina haviam convencido as pessoas de que a vida deveria ser indolor. Como a morte estava associada à dor, o assunto era evitado. Os adultos raramente faziam referência a qualquer coisa que estivesse relacionada com a morte. As crianças eram despachadas para outros cômodos da casa quando o assunto era inevitável na conversa. Mas fatos são fatos. A morte é parte da vida, a parte mais importante da vida. Médicos brilhantes que sabiam como prolongar a vida não compreendiam que a morte era parte dessa mesma vida. Quando não se tem uma boa vida, estando aí incluídos todos os momentos finais, não se pode ter uma boa morte. A necessidade de explorar essas questões de um ponto de vista acadêmico, cientifico, era tão grande quanto era inevitável...”


Com a transcrição deste texto, na verdade, parte do cap 19 (Sobre a morte e o morrer), temos a essência do trabalho de Klüber-Ross que deveria ser parte de qualquer reflexão sobre a finitude humana, seja do ponto de vista cientifico, teológico ou filosófico.

É interessante lembrar que os pacientes que mais mereceram sua atenção e cuidado foram os pacientes considerados terminais e idosos em institutos de repouso, mas que se sentiam abandonados e desiludidos com a vida (falo com conhecimento de causa, pois durante o ano que passei num instituto para idosos como psicólogo clinico, pude vivenciar e aprender mais sobre a temporalidade e finitude do ser humano do que qualquer livro ou cursos puderam me ensinar), lamentavelmente é verdade que Kluber-Ross, que tanto cuidou de pacientes nessas condições, morreu abandonada e sozinha.

Exemplos como este, nos faz acreditar em ironia do Destino. Nesse caso não foi apenas um grave descaso referencial, foi um descaso com a própria dignidade humana

*Professor do Centro de Biociências da UFRN(Juarez@cb.ufrn.br)

2 de jul. de 2009

O GAFANHOTO VOA




O Gafanhoto Voa
* Juarez Chagas

Quando li sobre a morte de David Carradine (1936-2009), no ultimo dia 4 deste mês, a principio não pensei escrever este artigo, talvez para que o mesmo não sugerisse apenas comentários oportunos, focado no ocorrido. Entretanto, a mídia continua a divulgar o assunto (principalmente nos EEUU e Europa) inclusive, porque pairam duvidas e suspeitas sobre a causa mortis do ator, então com 72 anos, onde alguns tablóides ficam divididos entre os motivos suicídio e jogos eróticos sexuais, uma vez que seu corpo teria sido encontrado nu e dependurado numa corda, num luxuoso apartamento de um hotel em Bangkok, na Tailândia. Carradine estava em Bangkok para as filmagens de "Stretch".

Eu prefiro me reportar ao que a pessoa e ator David Carradine significam para o mundo das artes cênicas, incluindo aí teatro, televisão e cinema pois o mesmo, independentemente de sua vida pessoal, tornou-se um invejável ícone, ao longo de mais de quatro décadas, com uma filmografia que soma quase 200 filmes e 30 seriados de tv.

Na verdade, David Carradine, pertence a uma família de atores, cujo sobrenome tornou-se uma importante marca no meio cinematográfico, a começar por seu pai, o velho John Carradine (um dos atores preferidos de John Ford, principalmente em papeis secundários) que acabou trazendo quase toda a família para as tela de TV e cinema.

É inegável que Carradine tenha ficado conhecido internacionalmente por causa do famoso seriado de TV intitulado Kung-Fu (1972-1975), marcando toda uma geração ocidentalizada que, de repente, resolve absorver princípios filosóficos do Oriente, através de uma historia (imagine só, baseada num dos mais famosos westerns americanos: Shane).

Na serie, Carradine interpreta Kwai Chang Caine, um andarilho criado por monges do Templo Shaolin, para se tornar um mestre de Artes Marciais (simplesmente chamado de Caine, ou Gafanhoto, por seu mestre, portanto observe a semelhança do nome, com Shane), tendo sido, pelo tamanho sucesso, indicado para os prêmios Emmy e Globo de Ouro. Temos que admitir que o americano faz cinema como ninguém e, suas formulas, algumas vezes absurdas, acabam transformando atores em verdadeiros padrões estigmatizados ou não. Carradine, por sua vez, transformou-se num ícone da televisão americana dos anos 70.

Sobre o seriado Kung Fu, há algumas considerações a fazer. Primeiro, o Kung Fu não chegou na América através de Carradine. Este apenas pegou uma carona no boom das Artes Marciais que invadiu a América no final dos anos 50, com seu auge nos Anos 60 e toda a década de 70, com a imigração de Japoneses e Chineses que estabeleceram sua cultura, sendo as Artes Marciais uma de suas principais bandeiras. Nesse contexto, como não podia deixar de lembrar, entra o Pequeno Dragão, Bruce Lee que, com sua arte e persistência conquistou, não apenas os EEUU, mas todo o mundo.

Porem, a historia de Lee Siu Lung (1940-1973) é uma das mais impressionantes historias de sucesso de um artista marcial na sociedade contemporânea. Entretanto, como não poderia deixar de ser, teve igualmente seus percalços, controvérsias e contradições. Na verdade, Bruce nasceu em São Francisco, Califórnia, quando seu pai passava por essa cidade, acompanhando uma opera de teatro chinês, da qual fazia parte. Bruce, só voltaria a América aos 19 anos para estudar Filosofia, na Universidade de Washington. Embora cidadão americano, o inicio de sua vida nos EEUU não foi fácil e, foi discriminado, trabalhou duro ate conseguir abrir sua escola de artes marciais. Porem, alem de seus alunos comuns, dava aulas particulares a celebridades como Steve MacQueen, James Coburn, Roman Polansky, Kareem Abdul Jabar, dentre outros. Isso foi o caminho para a tv e o cinema. Começava, então sua trajetória não apenas nas artes marciais, mas também cênicas.

Assim, em 1966 Bruce estréia, ao lado de Van Williams, no famoso seriado de TV, The Green Hornet (O Besouro Verde, 1966/1967), produzido por William Dozier (1908-1991), o mesmo produtor do seriado Batman. O seriado foi interrompido porque Kato (Bruce Lee), o motorista do Besouro Verde (Van Williams), com suas habilidades marciais, passou a ser mais famoso do que a personagem principal e, portanto, iria de encontro ao enredo original da historia. Resultado: fim do seriado e tristeza geral de todos.

Mas, em 1971, Bruce que colaborava com o projeto do seriado The Warrior (O Guerreiro), que viria a ser depois simplesmente Kung Fu, recebe um telegrama notificando que ele não seria o escolhido para o seriado e sim David Carradine. Isso, evidentemente, o indignou, como também aos fans, pois Carradine não sabia sequer, amarrar uma faixa de kimono, no entanto iria protagonizar um dos mais importantes seriados de TV da América.

De qualquer forma, o Destino já estava tomando suas providencias e, Lee passou direto para filmes lançados em Hong Kong, depois EEUU e Europa, com estrondoso sucesso, ate que veio sua consagração definitiva com Operação Dragão (Enter The Dragon, WB 1973), conquistando Holywood, como tanto sonhava. Resultado: as Artes Marciais vivem seu segundo boom! Foi lamentável o Pequeno Dragão não ter vivido para ver.

Carradine, por sua vez, também notabilizou o seriado que não perdeu sua forca e nem filosofia, muito pelo contrario, quem ganhou foi a TV e o cinema, e o publico, respectivamente. O Pequeno Dragão, deixou de lançar suas chamas em 20 de Julho de 1973 e agora o Gafanhoto voa.

*Professor do Centro de Biociências da UFRN(Juarez@cb.ufrn.br)

1 de jul. de 2009

POBRE MENINA


Pobre Menina
* Juarez Chagas

A importância do cenário musical pop dos Anos 60, sobre a qual tenho também eventualmente escrito alguma passagem, que merece recordação sobre os Anos Dourados, realmente permanece viva no imaginário individual e coletivo de toda aquela geração. Acho que por causa de eventuais referências a essa importante época, alguns leitores as vezes que nos acompanham, solicitam mais dados sobre o assunto.

O legado desta riquíssima época de ebulição, libertação cultural e sobretudo de uma conquista de novos valores através de pensamentos, atitudes, ideologia e novas realizações através da arte, música, literatura e outros movimentos e expressões sociais legítimos e autênticas, permanece até hoje como inspiração dos Anos Dourados, seja no âmbito fonográfico, artístico, cultural e, por que não dizer, em todos eles, ao mesmo tempo. E por esta razão, sempre emociona os participantes desse período único, tenham sido eles atores ou publico, pois um não existiria sem o outro e, ambos protagonistas do mesmo palco que foi a época. Por essa razão que fluiu a magia lírica e poética, embora algumas vezes pela rebeldia, marca própria da juventude.

O artigo intitulado “É Papo Firme”, sobre a música homônima do RC (JH de 22/4/2009, edição vespertina), rendeu também uma cobrança de um leitor, o qual comenta o artigo e pergunta se eu visitei o site oficial de Leno (http://www.leno.com.br/), sobre quem o leitor tem grande admiração. O mesmo lembra a musica Pobre Menina e faz questão de dizer que esta foi a musica dedicada a sua namorada, na época (hoje sua esposa), embora pelo que eu saiba, ela não fosse nada pobre, nem ele tão pouco e a musica muito menos. É por isso que, muitas vezes, o entendimento reside no oposto e no paradoxal...

Realmente, a música “Pobre Menina” (1966), inesquecível, marcante e importantíssima versão de Leno & Lilian da canção Hang On Sloopy, dos The McCoys (1965), não somente foi um dos maiores sucessos da época, como teve um forte sentido para a juventude brasileira e, em especial para a juventude natalense dos Anos 60, pois sendo Leno de Natal (o que nunca negou, muito pelo contrario, diferentemente de muitos outros artistas nascidos na capital potiguar), sentiam-se mais orgulhosos e identificados com tudo o que esta música representava.

Porem, antes de comentar mais sobre Pobre Menina, deve-se fazer justiça sobre sua inspiradora original que foi Hang on Sloopy, do grupo de rock, The McCoys, como já disse. The McCoys foi um grupo de pop rock da cidade de Indiana, EEUU, surgido em 1962 e que tem em Hang on Sloopy seu sucesso absoluto, através do qual ficou conhecido mundialmente. Entretanto, como todo grande sucesso tem uma trajetória peculiar, não foi diferente com "Hang on Sloopy" que foi gravada originalmente com o titulo de "My Girl Sloopy" pela banda The Vibrations em 1964, ficando entre as 30 músicas mais tocadas na época. Mas, a consagração viria com The McCoys, tornando-se sucesso absoluto e regravada por varias bandas, concomitantemente, inclusive pelos The Yardbirds, num estilo a lá Stones (bom lembrar que The Yardbirds teve ninguém menos que os feras Eric Clapton e Jeff Beck e depois Jimmy Page antes de fundar o Led Zeppelin. O grupo surgiu em Londres em 1963, e uns 5 anos depois já dividiam o comando dos palcos com bandas como The Animals e os The Rolling Stones).

Outro sucesso da música Hang on Sloopy é que esta se tornou a musica oficial do time de futebol Ohio State Football, desde o inicio de seu sucesso, sendo considerado hoje o hino que incita o time durante o intervalo dos jogos, fazendo parte também das “Canções da Universidade de Ohio”.

Outra curiosidade e ao mesmo tempo informação é que apesar de muitos tentarem traduzir o titulo da música esbarrarão apenas no apelido da cantora de jazz de Ohio, Dorothy Sloop (1913-1998) que usava o nome Sloopy, nos palcos e a quem a música homenageia (na verdade, a palavra Sloop significa corveta ou pequeno cruzador dos mares. No sentido literário, quem sabe algo pequeno que viesse a vencer grandes torrentes...). Outra nuance que se pode atribuir a canção é que esta foi composta no meado dos anos 60, portanto durante o movimento dos direitos civis e humanos, guerra do Vietnam, movimento Hippie e liberação da Mulher e, portanto, talvez traga um pouco de tudo isso em sua letra, pois o refrão “Hang on Sloopy, Sloopy hang on”, quer dizer “Aguenta firme Sloopy...segura a barra,” embora, se formos ver e ouvir o clip original com mais atenção é possível perceber também indução à liberação feminina no final do coro.

Ao fazer a versão de Pobre Menina, Leno não apenas foi sensível como inteligente, pois o lado simples e lírico da musica é contagiante, oportuno e falava a todos como um conto de fadas, mostrando que nos Anos Dourados, o romantismo era forte, inclusive no Rock ‘ n Roll. Pobre Menina foi e ainda é uma das músicas mais ricas da dupla Leno & Lílian.
Vejamos a versao da musica e a originalidade da dupla em algumas estrofes, o que caracterizou seu estilo inconfundivel do que diz respeito a sua letra e melodia:
Pobre Menina
Leno e Lilian
Composição: Farrel - Vrs. Leno / Wess

Refrao x 2
E aba eaba
Pobre menina não tem ninguém
Pobrezinha ela mora em um barracão
E todo mundo quer magoar seu coração
A mim não interessa quem sejam seus pais
Porque pobre menina eu te quero demais
Refrao
E aba eaba
Pobre menina não tem ninguém
Vive mal vestida em seu bairro a vagar
E em toda sua vida só tem feito chorar
Como num conto de fadas nós vamos casar
E então toda tristeza vai acabarAvai acabar
Refrao
E aba eaba
Pobre menina não tem ninguém
E, respondendo ao amigo leitor, vi sim o site de Leno, também admiro seu trabalho e recomendo a todos, especialmente aqueles que viveram os Anos Dourados.

*Professor do Centro de Biociências da UFRN(Juarez@cb.ufrn.br)

30 de jun. de 2009

HANG ON SLOOPY


Hang on Sloopy
*Juarez Chagas

A canção Hang on Sloopy, dos The McCoys, foi apenas uma das musicas pop cuja historia reflete um pouco do comportamento da geração dos Anos Dourados, em amplo sentido, não apenas discografica ou artisticamente falando, porem por sua representação social do momento e seu significado como fazendo parte do movimento contestador de toda uma geração pop que eclodiria, nos EEUU, definitivamente no final dos anos 60, com o Festival de Woodstock (69).

Evidentemente que este movimento cultural jovem já era conseqüência e resultado de uma serie de fatores contra os quais os jovens e grupos rebeldes setorizados demonstravam suas atitudes contra o establismentarianism, tendo a musica em si como pano de fundo, onde dentre alguns símbolos marcantes do movimento, podia se ver logomarcas de uma pomba descansando no braço duma guitarra ou flores saindo do cano duma metralhadora ou de um tanque de guerra, ou mesmo o punho cerrado com os dedos indicador e médio em V, substituindo a frase Peace and Love que, se transformariam em marcas de grife, camisetas (T Shirts), toalhas, bottons, chapéus, cintos, enfim, tudo o que o marketing da época pudesse fazer para divulgar e barganhar em cima duma realidade que, diga-se de passagem, parecia um sonho.

A frase “O Sonho não Acabou...” (The dream is not over), a qual tornou-se uma esperança latente e usada por muitos, posteriormente, vem dessa unidade que parecia paradoxal, mas que na verdade, era uma coisa só, composta de muitos conteúdos representando o coletivo e o individual, não apenas no imaginário de uma geração jovem, mas de grande parte de uma sociedade que vivia novos tempos.

Entretanto, ate então, genuínos “rockers”, tendo a frente Chuck Berry (cujo titulo de inventor e pai do rock é justíssimo!) conduziam sabia e marcantemente o Rock and Roll, somente depois seguido por Elvis Presley e uma gama de jovens talentos responsáveis por não deixarem o velho Rock ‘n Roll se transformar em apenas um rotulo, principalmente os 4 cabeludos de Liverpool que ainda se contentavam em viver a era Chuck e beber em sua fonte original, muito embora filtrando a ‘água. Este era mais ou menos o cenário de então.

A batida seca, cadenciada e forte, porem sugestiva e melódica ao mesmo tempo, do rock Hang on Sloopy, chegou ao Brasil como uma euforia contagiante, que logo se espalhou não só pelo cenário musical da mídia da época, mas também nas festinhas (em Natal eram os inesquecíveis “assustados” e matinés em clubes ou teatros), boates, reuniões de grupos e bandas de cantores atentos ao que ocorria na terra do Tio Sam, principalmente.

A parte lírica da musica também é muito rica e, inclusive pra mostrar que na poesia mais vale a concordância da rima ou do sentido da mensagem, do que a própria semântica, temos também o exemplo do erro proposital da concordância verbal, quando a estrofe “Sloopy I don’t care what your Daddy do” - sabemos que Daddy é um sujeito na 3ª pessoa do singular, portanto o verbo usado deveria ser “does” e não “do” - (Sloopy eu não ligo para o que seu pai faz, o que Leno sabiamente versou como “A mim não interessa quem sejam seus pais...), para que pudesse rimar com “ ‘Cause you know Sloopy girl, I’ m in love with you (porque você sabe Sloopy, que tou apaixonado por você).

Leno, por sua vez, iniciando a formação da dupla Leno & Lílian, filtrou como ninguém a idéia da música e, numa versão muito feliz, fez o sucesso da mesma no Brasil e, a partir daí passou a mostrar a todo o pais verde e amarelo, os sucessos da própria dupla.

A propósito da velha batida do Rock ‘n Roll, cravada com o irretocável solo estridente, contundente ou meloso, segundo a história e significado de cada música, como por exemplo Day Tripper (The Beatles), Satisfaction (The Rolling Stones) ou Hang Sloopy (The McCoys) e outros mais recentes como Up Around The Bend (Credence Clearwater Revival), as guitarras quase “falavam as expressões sonoras” que, sem exagero algum, já diziam mais que a metade da própria musica. Nesse contexto, George Harrison foi ao lado de, ninguém mais ninguém menos que Hendrix, precursor de solos e riffs, que depois puderam ser imitados por meio mundo do rock, com solos que mostravam ir alem de sua capacidade e restrição musical, sugerindo inclusive uma segunda voz inspirada nessa vertente.

Como dissemos no artigo anterior, quando The McCoys gravaram Hang on Sloopy, em 1965, jamais poderiam imaginar que anos mais tarde esta música também pudesse se transformar em sinônimo do Time de Futebol (americano) de Ohio, constituindo-se num incontestável fenômeno para as torcidas organizadas e público em geral. Na verdade, a canção tornou-se parte da tradição ritualística dos eventos do time, onde nenhuma outra música representa, pois é considerada “a musica de Ohio”.

Relembremos (quem viveu a época) HANG ON SLOOPY ou vejamos (quem não eh da época) como o significado da canção tem sentido ambíguo e, por vezes, metafórico:

Hang on Sloopy

Hang on sloopy, sloopy hang on (Agüente firme, Sloopy, Sloopy, agüente firme)
Sloopy lives in a very bad part of town (Sloopy mora no lado ruim da cidade)
Everybody yeah, tries to put my sloopy down (Todo mundo tenta humilhar minha Sloopy)
Sloopy I don't care, what your daddy do (Sloopy, eu não ligo pra o que seu pai faz)
’Cause you know sloopy, girl, I'm in love with you (Porque você sabe, garota, tou apaixonado por você)

And so I’m sigging now

Hang on sloopy, sloopy hang on (Agüente firme, Sloopy, Sloopy, agüente firme)
Hang on sloopy, sloopy hang on(yeah) (yeah) (yeah) (yeah) (yeah) (yeah)
Wo, uh, wo, uh, wo, uh, wo, uh

Sloopy let your hair down, girl (Sloopy, deixe seu cabelo solto)
Let it hang down on me (deixe-o solto sobre mim)
Sloopy let your hair down, girl (Sloopy, deixe seu cabelo solto)
Let it hang down on me (deixe-o solto sobre mim)

Come on sloopy (come on, come on)
Come on sloopy (come on, come onSo come on sloopy
(come on, come on)Come on sloopy (come on, come on)
Well it feels so good (come on, come on)You know it feels so good
(come on, come on)
Well shake it, shake it, shake it sloopy (come on, come on)

Well shake it, shake it, shake it yeah, yeah, yeah (come on, come on)
Hang on sloopy, sloopy hang on(yeah) (yeah) (yeah) (yeah)
Hang on sloopy, sloopy hang on(yeah) (yeah) (yeah) (yeah)
Hang on sloopy, sloopy hang on(yeah) (yeah) (yeah) (yeah)

Por essa e outras razoes, os Anos Dourados foram real e incontestavelmente, dourados, cujo brilho é sempre reavivado quando neles se fala.

* Professor do Centro de Biociências da UFRN(Juarez@cb.ufrn.br)

16 de abr. de 2009

DE FRENTE PARA O SOL

De frente para o Sol
(Publicado no O Jornal de Hoje)
*Juarez Chagas

Esse é o título do novo livro de Irvin Yalom, o mesmo autor de “Quando Nietzsche chorou”(1992), este por sua vez, seu primeiro romance e de bastante sucesso, que romantiza a vida de Friedrich Nietzsche e Josef Breuer, e que é muito conhecido, não somente no âmbito da Psicologia, mas como nas áreas de humanas, filosóficas e afins.

De frente para o Sol (Staring at the Sun, 2008, editado no Brasil pela editora Agir, 230 pgs) está sendo muito comentado, especialmente nos EEUU e Europa e, especificamente no âmbito da Tanatologia que é o objetivo de Yalom, neste trabalho, onde ele, através de seu livro mais pessoal até hoje escrito, aponta, discute e discorre sobre suas crenças íntimas, como uma forma de interação como psicoterapeuta e escritor.

O autor, agora com 78 anos de idade e mais introspectivo, é um escritor americano, filho de imigrantes russos, formado em psiquiatria, pela Universidade de Stanford que, surpreendentemente, alcançou a lista de livros mais vendidos nos Estados Unidos com Love's Executioner and Other Tales of Psychotherapy (no Brasil traduzido como Love’s Carrasco & Outras Histórias de Psicoterapia,1989), passando a partir daí a chamar a atenção da crítica literária para deslumbramento de seus seguidores e antipatia e resmungos de seus desafetos. Yalom, não iria querer ficar famoso sem ter que enfrentar a indisposição de invejosos que, só pelo sucesso de seu próximo, sentem-se incomodados e vingativos.
Falar sobre o novo livro de Yalom, que acabo de ler recentemente, não apenas como consulta para pesquisa sobre Tanatologia, porém também como interesse pessoal, implica em algumas considerações que, por mais que tentemos evitar, acaba tendo também conotações próprias, fato este, praticamente impossível de se evitar para quem se aprofunda nas obras e seus autores, sempre com a intenção de captar mais sobre o contexto e suas nuances. Ler um livro como um simples leitor é uma coisa e ler um livro como um pesquisador do autor e sua obra é outra coisa. E, confesso, não sei qual o melhor ou pior entre os dois. Talvez, quem sabe, ler o mesmo duas vezes com objetivos diferentes, seja o ideal.
De frente para o Sol, título escolhido pelo próprio Yalom como uma analogia à situação de que nem o sol e nem a morte podem ser encarados de frente (não considerar o quase pleonasmo, pois encarar tem que ser de frente mesmo), mas inspirada numa frase de François de La Rochefoucauld (não confundir com Michel Foulcault), que diz que “Nem o sol nem a morte podem ser olhados fixadamente” (Le soleil ni la mort ne se peuvent regarder en face).
Pra quem já leu o livro, admite que uma das primeiras coisas a se notar é que o autor faz questão de imprimir uma opinião pessoal de sua visão particular perante a morte e, acima de tudo, inspirada em seus predecessores intelectuais como, tanto os do século XIX quanto os do século XX, Pinel, Freud, Jung, Pavlov, Skinner, dentre outros, isso sem falar na própria filosofia de Epicuro sobre a morte, na qual ele tem se inspirado profundamente.
Mas, Yalom admite também ter tido alguns problemas com sua posição pessoal de ateu, assim como também com sua maneira individual de ver a sua própria angústia e o fantasma da morte e de sua inevitabilidade. Por outro lado, entende o papel das religiões em nos oferecer uma resposta para nossa existência, sobre a morte e todas as nossas construções imaginárias até então feitas pelo homem, mesmo contestando a questão da fé. Porém, prega que a morte não deve ser temida e discorre sobre uma série de exemplos, vividos em seu próprio consultório, de terapia para ajudar pacientes com angústia de morte. Diga-se de passagem, uma área dominada por poucos.
Na verdade, Yalom mostra, ao longo do livro, através de vários casos e histórias de seus próprios pacientes e, sobretudo através dos ensinamentos de seus mestres e sua larga experiência de meio século sobre como encarar a finitude humana, que novas perspectivas se abrem para transformar a idéia da morte, mesmo sendo algo insuportável como a luz ofuscante do sol, em energia vital e imprescindível para o ser humano, pelo menos como um raio de luz que vislumbre a trajetória do ser humano e que o mesmo não caminhe tão às escuras como vivia o homem das cavernas.
Entretanto, se formos mesmo comparar o homem de Neardental com o atual, em termos de atitudes perante o próximo e o coletivo, apesar de todo utensílio tecnológico e suas ferramentas de última geração, confesso que talvez o primeiro fosse menos animal...

*Professor do Centro de Biociências da UFRN(juarez@cb.ufrn.br)

A GALINHA DOS OVOS DE PÁSCOA

A Galinha dos Ovos de Páscoa
(Publicado no O Jornal de Hoje)
* Juarez Chagas

É a segunda vez que passo a Páscoa em Lisboa e, confesso, apesar da tradição européia pela data, “não se faz cá mais Páscoa como antigamente”, como dizem os patrícios. É verdade que o almoço e jantar são especiais para o momento entre as famílias e amigos e, indiscutivelmente, os melhores vinhos para degustar e dar rumo às conversas. Mesmo assim, sou muito mais nossa Páscoa simples e habitual de Natal, mesmo que o calor da Cidade do Sol, nesta época, quase derreta os ovos de chocolate, enquanto o frio da Europa quase os petrifique, concomitantemente.

É evidente que não me refiro aos festejos tradicionais comemorativos que ainda existem em algumas regiões típicas e que valem a pena serem vistas, como é o caso da “Festa das Tochas em Flor”, em São Brás de Alportel, na região da Serra de Algarvia, em Faro, já ao sul de Portugal, mais ou menos a uns 180km de Lisboa, onde uma bela procissão de Aleluia, em honra de Cristo, é feita com flores colocadas em tochas, ao invés de postas em andores e, o chão é também coberto de flores por onde passa a procissão. É um espetáculo belo de se ver, sem falar nas missas tradicionais, repletas de fies e curiosos.

Mas, a representação simbólica dos ovos de chocolate é referente aos ovos de galinha ou de coelho? De galinha, claro. Coelho é mamífero e mamíferos não põem ovos, exceto o esquisito ornitorrico que confundiu até George Cuvier, Darwin e outros evolucionistas da época e ainda intrigam os mais famosos cientistas, especialmente os geneticistas, até hoje, e que, diga-se de passagem, põe ovos de verdade! Ninguém sabe se este gênero de mamífero está em extinção, transição ou evolução. Coisas que só a Natureza explica.

Por causa de suas características peculiares, o bicho merece um parágrafo a mais, para melhor entendimento, pois é realmente um animal estranho com pele, pêlos, bico de pato, rabo de castor e patas interdigitais, recentemente citado pela revista Nature como uma mistura de réptil, pássaro e mamífero. Na verdade, não quiseram arriscar reclassificá-lo. Esse animal exótico vive na Austrália e na Tasmâmia, às margens dos rios, mede de 40 a 50 cm de cumprimento, sendo que a fêmea tem tetas e produz leite para alimentar os filhotes, porém paradoxalmente são ovíparos. Sua pele é adaptada à vida na água e o macho possui um veneno comparável ao das serpentes. Claro, diferentemente do coelho, não tem qualquer relação com a Páscoa, a não ser a palavra ovo.

Mas...como era a Páscoa antigamente, então? Pra saber, vale a pena rebuscar no passado, pois a idéia de trocar ovos de chocolate surgiu na França, quando antes disso, eram usados ovos de galinha para celebrar a data. Assim sendo, a tradição de presentear com ovos verdadeiros é muito, muito antiga e as galinhas dos ovos de páscoa deviam ser escolhidas a dedo, suponho. Na Ucrânia, por exemplo, centenas de anos antes da era cristã já se trocavam ovos pintados com temas sugerindo homenagem à celebração da chegada da primavera.

Os chineses e os povos do Mediterrâneo também tinham como hábito dar ovos uns aos outros para comemorar a estação do ano. Para deixá-los coloridos, cozinhavam-nos com beterrabas.

Mas os ovos não eram para ser comidos. Eram apenas presentes que simbolizavam o início da vida. A tradição de homenagear essa estação do ano continuou durante a Idade Média entre os povos pagãos da Europa. Eles celebravam Ostera, considerada a deusa da primavera, então simbolizada por uma mulher que segurava um ovo em sua mão e ao seu lado tinha um coelho a pular alegremente ao redor de seus pés, representando a fertilidade. Foi assim que o coelho entrou na história da Páscoa por sua reprodutividade e valor de renovação da vida.

Por outro lado, Os cristãos apropriaram-se da imagem do ovo para festejar a Páscoa, celebrando a ressurreição de Jesus. Na época, pintavam os ovos, geralmente de galinha (mas podia ser de outras aves domésticas, também), com imagens de figuras religiosas, como o próprio Jesus e Maria, sua mãe.

A partir de toda essa tradição e idéia, e nos tempos modernos, um espertinho qualquer com tino comercial, usou o chocolate para representar os ovos, a data e ficar rico, evidentemente, além de brindar o sucesso comendo o chocolate e fazendo com que todos, levados pelo espírito da renovação, numa maneira gostosa, troquem ovos de chocolate, carinhos e afetividade, desejando-se mutuamente uma Feliz Páscoa para todos.

Também “aproveitando” a ocasião da data muitas instituições e muitos políticos desejam “Feliz Páscoa” para todas as crianças e pessoas de todo o mundo (maioria das quais sequer podem comer um pão com ovo, como única refeição ao dia), ao invés de defenderem políticas públicas (cevam a galinha dos ovos de ouro só para eles), onde a vida fosse mais justa socialmente e a fome fosse varrida deste planeta e não fosse uma das mais deprimentes causa mortis em todo o mundo.

* Professor do Centro de Biociências da UFRN(juarez@cb.ufrn.br)

1 de abr. de 2009

APRIL FOOL'S DAY

April Fool’s Day
(publicado no O Jornal de Hoje)

*Juarez Chagas

Hoje é 1º de Abril, dia da mentira, ou April Fool’s Day (Dia dos tolos, melhor traduzindo), como queiram os americanos, um dos povos que mais cultuam datas comemorativas, não necessariamente, oficiais, mas já enraizadas na cultura popular, como Valentine’s Day (Dia dos Namorados), Holloween (Dia das Bruxas), entre outras.

A história do Dia da Mentira tem origem incerta, mas uma coisa ninguém pode duvidar: deve ter sido inventada por um grande espertalhão e gozador ou, por sua vez, inspirado no tipo.

Uma das versões para a explicação da origem do dia da mentira (entenda-se bem: uma das versões para a origem e não a data da origem, pois a mentira, assim como a verdade, é tão antiga quanto o homem) remonta o período romano, onde contam que durante o reinado de Constatino, quando um grupo de palhaços e bobos da corte disse, em sua irreverência, ao imperador romano que eles poderiam conduzir o império melhor do que o próprio imperador. Constantino, num flash de gracejo e desafio, permitiu a um dos tolos que fosse rei por um dia e, uma vez no poder, o tolo decretou o dia do absurdo, onde mentir era permitido! Bem...não é preciso dizer que o reinado do bobo foi apenas um dia, mas o da mentira durou ad eternum! Acho que depois dessa versão, as outras ficariam prejudicadas se fossem contadas...

Trazendo a questão para o âmbito do comportamento humano como um fator social, cujas conseqüências são, por vezes, desastrosas, comprometedoras e até criminosas, a mentira tornou-se, através dos tempos, um dos mais graves problemas sócio-comportamentais do ser humano. E, nesse sentido, cabe a pergunta do estudo de David Livingstone Smith, Psicólogo e antropologista cognitivo, a qual é título do seu livro sobre o tema: Por que mentimos e por que somos tão bons nisso? Ele mesmo responde, sinteticamente: porque funciona.

Livingstone nos lembra que o ato de mentir permeia a vida humana e é uma habilidade que brota das profundezas de nosso ser, e nós a usamos sem cerimônia e, pior ainda, muita gente não pode viver sem. É interessante também a idéia secular de Mark Twain, que diz o seguinte: "Todos mentem... todo dia, toda hora, acordado, dormindo, em sonhos, nos momentos de alegria, nos momentos de tristeza. Ainda que a boca permaneça calada, as mãos, os pés, os olhos, a atitude transmitem falsidade". Na verdade, Twain era convicto de que enganar é fundamental para a condição humana e por isso, muitas vezes a mentira permeava seus romances. Hoje, estudos e pesquisas científicas, constatam que o sábio escritor continua certo.

A mentira, especialmente a que causa danos, muitas vezes irreparáveis, tanto para o mentiroso quanto para, pior ainda, quem nele acredita, pode ser compulsiva e patológica. Analogamente, poderíamos comparar com a megalomania (mania de grandeza), o que já é, além de uma patologia, um tipo de mentira. Pois tem gente que quanto mais mente, mais na sua própria mentira acredita, não importando as consequências. Não é incomum pessoas procurarem ajuda psicológica por causas de problemas que, à primeira vista, nada têm a ver com a mentira, mas que na verdade foram causadas por ela.

Nesses casos o psicoterapeuta procura ter, além da ética, o bom senso, na relação com seus pacientes, sempre apresentando uma intervenção não-punitiva, ou seja, ouvir e não julgar, ouvir e não criticar, ouvir e não punir. Essa atitude, além de profissional e acolhedora (de modo algum conivente), torna possível uma relação aberta e verdadeira, podendo o tratamento ter êxito e sucesso, em virtude da correção pela verdade. Ou seja, vale aí a velha máxima: a cura está na causa e não na sintomatologia. E isso é uma verdade!

A propósito, o homem parece designado, resignado e destinado a viver sempre entre as dualidades da vida, tais quais o bem e o mal, o belo e o feio, o positivo e o negativo, o triste e o feliz, a verdade e a mentira...e, a propósito, escolhi uma das inúmeras frases sobre a mentira que, diga-se de passagem, até que ela seja descoberta, quase aniquila a verdade, parecendo ser a própria, muita vezes tornando um amigo em inimigo. Vejamos, pois o que Adlai Stevenson disse, inteligentemente: "Se meus inimigos pararem de dizer mentiras a meu respeito, eu paro de dizer verdades a respeito deles." A frase sucinta que a inveja é também uma grande mentora da mentira.

É vasta a literatura sobre a mentira e mais vasta ainda a própria mentira. Eu, particularmente, duvido, mesmo sabendo ser no sentido de brincadeira ou descontração, se foi bom a “instituição” do dia da mentira, pois para muita gente todo dia é 1º de Abril. E, considerando a real tradução da palavra “fool” ( tolo, bobo), April Fool’s Day não seria o dia da mentira e sim o dia do tolo, enaltecendo mais ainda que a mentira vence por sempre haver um tolo que nela acredita.

* Professor do Centro de Biociências da UFRN(juarez@cb.ufrn.br)

19 de mar. de 2009

A ESSÊNCIA DO SUJEITO

A Essência do Sujeito
*Juarez Chagas

Lendo o Método 5, A Humanidade da Humanidade, de Edgar Morin, cujo título original é La Méthode 5, L’humanité de L’humanité, lançado no Brasil pela editora Sulina (2005), o leitor encontra na segunda parte do livro que trata da identidade individual, o primeiro capítulo que discorre sobre “O Âmago do Sujeito”. O Método é sua principal obra e é constituída por seis volumes, tendo sido escrita ao longo de três décadas e meia. Trata-se de uma das maiores obras de epistemologia disponível e nele, podemos encontrar muitas referências de seus outros livros como O Paradigma Perdido: a Natureza Humana, O Homem e Morte, dentre outros.

Morin, sabiamente, como era de se esperar, inicia rebuscando a noção de sujeito, baseada tradição filosófica ocidental, apontando onde o sujeito “engessou”. Por isso ele faz um interessante trocadilho que sucinta sagaz reflexão: “Ser sujeito supõe um indivíduo, mas a noção de indivíduo só ganha sentido ao comportar a noção de sujeito”, e lá na frente ele conclui o parágrafo, enfatizando que “ser sujeito implica situar-se no centro do mundo para conhecer e agir”.

Edgar Morin, como já bem sabemos, é sociólogo, filósofo e um dos mais importantes pensadores da atualidade e um dos expoentes mais expressivos do pensamento mundial contemporâneo. É considerado um dos principais mentores do estudo sobre a complexidade e, para nosso deleite acadêmico, esteve em Natal por duas vezes, em maio de 1998 e em 2004, onde se encontrou com o pessoal do Grecom-Grupo de estudos da complexidade, na UFRN, onde proferiu palestras sobre o tema.

Na verdade, ele propaga seus estudos e pesquisas de caráter inter-poli-transdisciplinar sobre os problemas complexos que as sociedades contemporâneas hoje enfrentam, coletivas para resoluções e análises satisfatórias de tais complexidades.

Resumir o pensamento de Morin sobre a essência do sujeito, não é tarefa fácil nem tão pouco pretensão deste artigo. Entretanto, não deixa de ser interessante e, eu diria que, muito importante também, abordar tais considerações neste contexto, uma vez que o entendimento de sujeito, seu papel e lugar no contexto sociocultural muitas vezes é entendido de várias formas e percepções, o que concordamos, causa certa confusão. Além disso, há uma ampla visão, cujo entendimento sobre o âmago do sujeito, nos permite viajar em sua subjetividade, porém nada disso o impede de viver para si e para o outro dialogicamente, como aponta morin.

Por outro lado também, é interessante notar que na essência do sujeito, enquanto indivíduo, a subjetividade comporta a afetividade, evidentemente, fazendo com que o sujeito humano esteja destinado ao amor, à entrega, à amizade, à inveja, ao ódio e a todos os sentimentos e conteúdos que o movem na relação com o outro. E é fundamental não esquecer que a relação com o outro inscreve-se virtualmente na relação consigo mesmo. Essa reflexão nos faz lembrar Jean-Louis Vullierme quando o mesmo diz que “os sujeitos se auto-organizam em interação com outros sujeitos”.

Nesse sentido, chamo a atenção sobre um dos artigos que escrevi sobre Tanatologia, onde lembrava que a morte do outro é a morte de si próprio e entendemos melhor essa colocação quando aceitamos que a morte não é apenas a decomposição de um corpo, porém e igualmente o aniquilamento de um sujeito. Por isso é que a morte de um ente querido não aniquila apenas o outro, mas também o eu e o nós mais íntimos, abrindo, na quase totalidade das vezes, um insuperável e intransponível ferimento no âmago de sua subjetividade.

Na realidade, se todos nós entendêssemos nossa própria essência e a essência do outro, o mundo certamente teria melhores indivíduos, melhores sujeitos e ótimas pessoas.

* Professor do Centro de Biociência da UFRN (Juarez@cb.ufrn.br)

A MORTE SEGUNDO FREUD

Nós e a Morte, Segundo Freud
*Juarez Chagas

“Nós criaturas civilizadas tendemos a ignorar a morte como parte da vida...no fundo ninguém acredita na própria morte, nem consegue imaginá-la. Uma convenção inexplícita faz tratar com reservas a morte do próximo. Enfatizamos sempre o acaso: acidente, infecção, etc., num esforço de subtrair o caráter necessário da morte. Essa desatenção empobrece a vida...”.

O texto acima é de Sigmund Freud e é a introdução de sua palestra intitulada “Nós e a Morte”, proferida em 1916, a qual faz parte de sua obra “Considerações atuais sobre a Guerra e a Morte”, onde o psicanalista apresenta ao mundo científico da época, sua visão sobre a finitude humana e como ela deveria ser encarada por cada um de nós.

O texto de Freud tem a capacidade de nos conduzir a algumas reflexões nada rotineiras ou prazerosas, mas que todo ser consciente deveria fazer, porém no entanto, normalmente fugimos delas (reflexões).

Quem leu o trabalho de Freud “Nós e a Morte”, o qual originou-se de um ciclo de palestras proferido pelo mesmo em 1915, percebe que sua preocupação com a questão da morte tem base não apenas no declínio da condição biológica, mas também fortemente calcada na questão da guerra e sua capacidade destrutiva além da morte, algo que o afetou muito particularmente! Ele reporta-se, categoricamente, sobre o ato do homem matar seu inimigo desde sua época mais primitiva aos dias atuais, havendo um ponto comum entre o homem primitivo e o civilizado, no que diz respeito ao desejo de destruir quem o ameaça ou lhe oferece perigo, pois a consciência de que a guerra põe fim à atitude convencional ante a morte é planejada.

Interessante é que Freud diz que nosso inconsciente comporta-se de maneira semelhante ao do homem primitivo, pois este inconscientemente não acredita na própria morte, apesar de vê-la rondando e de abater seu próximo, constantemente. Por outro lado, sabemos que o consciente, como era de se esperar, apavora-se com a idéia da morte e, portanto, está aí gerado o conflito existencial. A propósito, Freud chama a atenção de que nossa atitude civilizada perante à morte é muito irreal e que “vivemos psicologicamente acima de nossos meios”, enquanto deveríamos conceder um espaço maior em nossas vidas para a morte, para que a vida se tornasse suportável conscientemente, embora sabendo de sua finitude e de suas conseqüências.

No meio de toda essa fantástica abordagem de Freud, me chama a atenção o fato dele se referir a “atitude civilizada” do homem frente à morte, mais de uma vez, como se admitisse ser uma obrigação para o homem moderno lidar melhor com sua terminalidade. É claro que fica evidente a comparação que o mesmo faz entre a maneira de encarar a morte e a guerra entre o homem primitivo e o homem civilizado, no entanto, observando a evolução humana através dos tempos, percebemos que a aceitação da morte como sendo parte da vida ou o fim desta, não avançou como deveria. É interessante observar que quanto mais moderno o homem, mais modernas suas guerras e suas mortes.

E sabido, não somente por causa da doença que o combalia, o definhava e o irritava cada vez mais, nos última anos de sua vida, mas também por cada vez mais admitir ser a finitude a última companheira do homem, que Freud defendia a idéia de que viver eternamente seria o maior fardo que o ser humano carregaria, se possível fosse. E isso não estava no seu inconsciente.


* Professor do Centro de Biociência da UFRN (Juarez@cb.ufrn.br)

RUA AUGUSTA

Rua Augusta
*Juarez Chagas

Em 2005, quando fui participar de um congresso de Tanatologia em São Paulo, realizei um simples e antigo desejo, relacionado à década de 60: percorrer a Rua Augusta, de seu início até o fim, no intuito de conhecê-la melhor, em toda a sua extensão.

Na verdade, eu já havia passado uma temporada
em SP quando estudava na Escola Paulista de Medicina (UNIFESP), por ocasião do Mestrado, nesta universidade e que fica a, apenas, alguns quarteirões de distancia da mesma. Porém, naquela época, apesar de, eventualmente passar por esta rua, não havia tempo para conhecê-la melhor, como pretendia. As energias e e todos os meus horários, inclusive finais de semana eram somente destinados para os estudos.

Pra quem não sabe, a rua Augusta virou um marco histórico para a juventude brasileira daquela época e representou, na década de ouro dos Anos 60, para os jovens, especialmente, os paulistanos, glamour e diversão. Era ao mesmo tempo, obrigatório e livre ponto de encontro da juventude paulistana das décadas de 60 e 70, constituindo-se numa importante via arterial da cidade, unindo os jardins ao centro da cidade. Seu início, a partir da rua Martins Fontes com a rua Martinho Prado até o cruzamento com a Avenida Paulista, forma uma acentuada subida que a partir deste ponto desce até o seu término na Rua Colômbia, que é, na verdade, uma continuação da mesma, porém com outro nome.

Atualmente, o trecho que vai do início da rua até o cruzamento com a avenida Paulista, se localiza na região centrala de São Paulo, onde se pode encontrar boites, saunas , pequenos restaurantes e casas de espetáculos, porém sendo um dos pontos de meretrício na cidade, um marco nada orgulhoso para a maior cidade brasileira, nos dias de hoje, mas que faz parte de sua geografia e urbanismo.

Não é nenhuma novidade o estilo de vida dos jovens dos Anos 60, embora muitos ainda seguissem a filosofia dos “Rebeldes sem causa”, defendido pelo estilo James Dean, dos anos 50, ou de Brando e Presley, dentre outros e, no Brasil, especialmente nas cidades consideradas “grandes e avançadas”, não era diferente.

No caso da Rua Augusta daquele tempo, os jovens paulistanos exibiam seus carros em alta velocidade pelo asfalto, encontros de turmas, grupos, casais de namorados, onde a onda do Rock n Roll, ainda imperava. Era o frisson da época subir a Augusta, no sentido Avenida Paulista , fazendo “pegas e cavalo-de-pau” e apostando corridas em grupos de 10 a 15 carros, no estilo “Juventude Transviada”. Era um delírio para todos: os jovens se deleitavam com a adrenalina e os pais ficavam às raias de infartos e colapsos nervosos.

Evidentemente que tudo isso não tinha apenas que ser vivido pela juventude, mas também cantado. E, assim sendo, a música Rua Augusta (1963), de Hervé Cordovil e, cantada e interpretada por seu filho Ronnie Cord (Ronald Cordovil), retrata muito bem toda essa rebeldia da juventude paulistana. Posteriormente, a música foi imortalizada pela Jovem Guarda, com Erasmo Carlos (o Tremendão) tornando-se um dos maiores hits dos anos 60. Muitos outros artistas também regravaram esse sucesso marcante, como os Mutantes, em 1972 e Raul Seixas, nos anos 80, quando gravou um disco em tributo ao Rock.

Por falar nisso, o programa Jovem Guarda, um programa de auditório, da TV Record, surgido em 1965, comandado por Roberto Carlos, Erasmos Carlos e Wanderléia, contribui sobremaneira para que Rua Augusta ficasse nacionalmente famosa (Aliás, o maior e mais famoso programa de música pop que o país já teve). Tem até o episódio com Erasmos Carlos que, empolgado com toda a história da Rua Augusta, comprou um fusca cor de abacate para subir e descer a rua, ainda nos velhos bons tempos. Dizem que o apelido “Tremendão”, do Erasmo foi por causa dessa música. Dizem também que parte da juventude paulista da época encarava isso como um insulto, pois paulistas e cariocas sempre tiveram suas diferenças.

Relembremos o significado e clima que a canção Rua Augusta passava para todos na Época de Ouro da juventude brasileira:
I
Entrei na Rua Augusta
A 120 por hora
Botei a turma toda
Do passeio pra fora
\Com 3 pneus carecas
Sem usar a buzina
Parei a quatro dedos
Da esquina
Falou!
Vai! Vai! Johnny
Vai! Vai! Alfredo
Quem é da nossa gangue
Não tem medo...(2x)

I I
Meu carro não tem breque
Não tem luz
Não tem buzina
Tem 3 carburadores
Todos 3 envenenados
Só pára na subida
Quando falta gasolina
Só pára se tiver
Sinal fechado
Tremendão!

III
Toquei a 130
Com destino à cidade
No Anhangabaú
Botei mais velocidade
Com 3 pneus carecas
Derrapando na raia
Subi a Galeria Prestes Maia
Tremendão!
Vai! Vai! Johnny!
Vai! Vai! Alfredo!
Quem é da nossa gangue
Não tem medo...(2x)
É bom lembrar que, apesar da música dizer a 120 por hora, eles paravam no sinal fechado, coisa que muitos jovens de hoje não fazem, demonstrando outro tipo de rebeldia que conduz à morte em muitas ruas do país.

* Professor do Centro de Biociência da UFRN (juarez@cb.ufrn.br)