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9 de set. de 2008

OS BRUTOS TAMBÉM AMAM

Os Brutos Também Amam
(Publicado no Jornal de Hoje )
* Juarez Chagas


Teatro, literatura e cinema, são indubitavelmente, os principais meios de representações dos conteúdos, da subjetividade e caráter da natureza humana, na contemporaneidade. Antigamente, podíamos fazer uma analogia mitológica. Agora, eu arriscaria ate dizer que, são verdadeiras escolas, nas quais o conhecimento sobre o homem e suas historias, podem ser igualmente ensinadas, divulgadas e armazenadas (agora com nova tecnologia) às gerações futuras, de forma inclusive autodidata. Alias, é muito mais que isso. É a arte humana que emana do seu próprio ser, norteando sua trajetória e sua busca.
Sobre o assunto, justifico o título do artigo explicando que, após muito tempo, consegui encontrar, no mercado livre da Internet, a revista Cinemin no. 58 (Ebal Novembro 1989), em sua 5ª serie, única da coleção que me faltava e que, salvo engano, foi publicada ate o no 86 (Out/Nov 1993). Esse numero, especificamente, traz em destaque a resenha do filme Os Brutos Também Amam (Shane, USA/Paramount, 1953), magistralmente produzido e dirigido por George Stevens, o mesmo que dirigiu Assim Caminha a Humanidade (Giant, 1955), mesmo ano em que morreria James Dean (o qual roubaria cenas de Elizabeth Taylor e Rock Hudson, tido como principais protagonistas do filme) quando o filme ainda estava sendo editado. James Dean não viu a estréia de Giant. Fato similar aconteceu poucas vezes em Hollywood, assim como Bruce Lee, morreu quando seu mais importante filme Operaçao Dragão (Enter the Dragon, 1973) também estava sendo editado. Bruce nao chegou a ver a estréia de seu filme que foi o primeiro filme de Artes Marciais filmado pela Warners e totalmente aceito por Hollywood, o qual é ainda hoje o melhor filme do gênero e do melhor artista marcial de todos os tempos.
Mas, voltando aos Brutos Também Amam, cujo título na verdade não retrata exatamente sua história, tendo sido muito mais uma jogada de marketing da época, do que propriamente fiel à trama e, nesse caso especifico, o titulo em Inglês (Shane) é muito mais real. Na minha opinião, foi um desses filmes injustiçados pela academia hollywoodiana, por não ter recebido o Oscar que merecia, mesmo sabendo que Allan Ladd não era um grande ator, porém teve o melhor desempenho de toda a sua carreira nesse filme e a sorte de ter sido dirigido por um gênio da sétima arte, que transformou esse western num dos maiores clássicos do gênero. Quando eu digo que Shane merecia o Oscar, estou comentando, por exemplo, que Matar ou Morrer (High Noon, 1952), de Fred Zimmermann, filmado um ano antes e protagonizando Gary Cooper e Grace Kelly, foi detentor de 4 Oscars. Não que Matar ou Morrer não tenha tido seu mérito, porém no roll dos clássicos, Shane foi considerado muito mais filme. Mas, não vamos discutir aqui a política de premiação do Oscar...
A história começa com Shane, um pistoleiro que foge do passado e pensa em dependurar as armas (mesmo vivendo uma época onde no Oeste o revolver ditava a lei), chegando a um vale, onde pequenos colonos tentam resistir às ameaças de um cruel latifundiário. Na passagem pelo seu cominho, cansado e com sede, ele se depara com um rancho onde pede informação e água ao seu dono, Joe Starret (Van Heflin). Nesse exato momento, os homens de Ryker (Emile Meyer chegam para “convencer” Joe a vender suas terras e ir embora. Porém, ao verem Shane, desistem da investida e resolvem contar ao seu chefe que há um pistoleiro no vale. Joe, por sua vez, convida Shane a pernoitar e em seguida o contrata para lhe ajudar a desenvolver seu pequeno rancho. Shane, em busca de paz, aceita a oferta. Na verdade, achava que ali, não precisaria mais usar os revolveres e sentiria a sensação do que é viver num pacato lar com uma família, embora nao fosse a sua.

A trama se completa quando o pequeno Joey, o filho do casal Starret (Brandon de Wilde) se apega ao pistoleiro, que também desperta um amor platônico em sua mãe, a Sra. Starret (Jean Arthur). Ryker, em contra-partida, para intimidar duma vez por todas os colonos e, para fazer frente a Shane, manda buscar o mais temido dos pistoleiros, na cidade Cheyenne, Jack Wilson (Jack Pallace). Esse sim, um pistoleiro sem alma, frio e sanguinário e que tinha matar como ofício.
Vale salientar que, assim como Allan Ladd teve em Shane seu melhor papel, esse foi um dos mais importantes papéis de Pallace (nessa época ainda conhecido como o pugilista Walter Jack Pallace), o qual o consagrou definitivamente como astro, apesar de ter participado, praticamente apenas do final do filme. Ele chega, por vezes, a roubar cenas de Allan Ladd, com grande categoria e excelente performance, quase sem dar uma palavra. O tipo longilineo, calado, calculista e frio completava a personagem, marcante que representa o lado mal da história.
O desfecho da história é, como se previa, espetacular, pois não há apenas um duelo entre Shane e Wilson, ou seja, entre o bem e o mal, porém uma grande profundidade de conteúdo sobre a natureza humana em conflito, onde quer que ela se passe, como sabia mostrar tão bem o velho Stevens. No momento do duelo, não se vê apenas dois pistoleiros em ação, mas todo um percurso humano em busca de suas conquistas, derrotas e seus resultados.
Após vencer Wilson e os demais bandidos, Shane ao invés de voltar para o rancho dos Starrets (apesar do pedido do pequeno Joey que o havia seguido), segue seu caminho sem rumo, como um andarilho, assim como havia chegado, pois ele sabe que seu maior conflito estaria naquele rancho e não nas balas dos revolveres fumegantes de seus inimigos. Então, parte sem destino em busca de si mesmo, deixando o pequeno Joey acenando e chamando seu nome ecoando nas planícies, para que voltasse. O pequeno Joey ver seu herói partir, mas muito dele ficara em si mesmo. Essa é mais uma das suaves belezas do filme, a cena tocante no final.
Nesse sentido, sobre a busca do ser humano, seja em que esfera ou área, o próprio James Dean costumava dizer que “Mais vale a angustia da busca do que a paz da acomodação”. Por isso Shane procurava a si mesmo onde nao podia encontrar.

* Professor do Centro de Biociências da UFRN/Juarez@cb.ufrn.br

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