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9 de set. de 2008

O AMOR DE OS "OS BRUTOS TAMBÉM AMAM"

O Amor de “Os Brutos Também Amam”
(publicado no O Jornal de Hoje)
*Juarez Chagas

Já escrevi dois artigos sobre Os Brutos Também Amam (Shane, Paramount 1953) e, parece interessante como este filme mantém, não apenas sua popularidade ao longo do tempo, mas ainda alfineta, nos dias de hoje, Hollywood por ter-lhe negado o merecido Oscar 1953, embora tenha tido indicação para o garoto estreante Brandon de Wilde (Joey) e vencido no gênero de Melhor Fotografia - A Cores.

Na verdade, esta fantástica produção cinematográfica mostra também, de uma maneira sutil, porém intencional, uma grande lição sobre as condição e natureza humanas, nos tempos do velho Oeste, onde terra, cavalos, gado, ganância e muito chumbo quente ditavam as leis, gerando a mesma velha e real temática do bem contra o mal, dos fortes contra os fracos e oprimidos, algo que a humanidade sempre carregará em sua natureza.
George Stevens (que dois anos antes tinha filmado o excente Um Lugar ao Sol e, que três anos mais tarde se consagraria com Assim Caminha a Humanidade) retratou muito bem a senda dos desbravadores de um lugar deserto, transformado num lugarejo a ser investido, assim como também a rápida passagem de um pistoleiro solitário e sem rumo que, de repente, chega nesse lugarejo, sem saber para onde seguir. Os homens e as poucas famílias do lugar parecem brutos, mas eles têem algo que todo ser humano tem: amor e ódio e isso aflora quando vêem suas conquistas ameaçadas ou prosperando, sob o olhar ganancioso de quem quer enriquecer fácil e às custas do suor dos outros. Foi isso que Stevens, com todo seu feeling e habilidade quis mostrar e, realmente, conseguiu como ninguém.
O filme trata, como vimos nos artigos anteriores, de um misterioso pistoleiro (Shane) que chega de repente num povoado em conflito devido a ambição por posse de gado e terras, comandada pelo ganancioso desbravador Ryker e seus homens contra pacíficos colonos que, timidamente tentam defender seus ranchos e famílias nas terras do Wyoming.
Ao atravessar o vale, sem rumo certo, Shane (vivido por Allan Ladd, no seu melhor papel cinematográfico) se depara com o rancho dos Starrett (Joe, Mirrian e Joey), uma pacata família que trabalha para se estabelecer no lugar, dignamente. Shane desce do cavalo para alguma informação e um pouco de água, quando os impiedosos homens de Ryker (Emilie Meyer) chegam para ameaçar Joe (Van Heflin) a vender seu rancho e sair de suas terras. Os homens vêm Shane ao lado de Joe e o indaga quem ele é. “Amigo dos Starret” responde tranqüilo com seu porte de pistoleiro, o que faz com que os homens se retirem raivosos e desconfiados. A partir daí, o expectador percebe que o filme promete.
Ao se dirigir para seu cavalo para continuar sua caminhada, Shane é convidado por Joe, por sugestão de Miriam (Jean Arthur), para jantar, durante o qual Joe narra toda a história da luta dos colonos no vale e o convida a trabalhar no rancho, como seu auxiliar, convite este que Shane acaba aceitando. Então, a história começa realmente a partir daí...
Os bastidores do filme foram repletos de curiosidades que merecem alguns comentários, como por exemplo, que George Stevens tinha escolhido Montgomery Clift para viver Shane e William Holden para desempenhar Joe Starrett, mas ambos não corresponderam às expectativas de Stevens. Já Katharine Hepburn tinha sido escolhida para viver Mirriam, mas acabou perdendo o papel para Jean Arthur, com quem Stevens já havia trabalhado anteriormente. Por outro lado, Jack Palace (na época mais boxeador do que propriamente ator) tinha problemas com cavalos a ponto da edição do filme ter simulado que ele montava na sela, enquanto na realidade descia dela. Já Allan Ladd tinha problemas com o domínio de armas a ponto da cena em que acertava num alvo à distancia, para ensinar a Joey a atirar, ter sido repetida umas 120 vezes até poder ser escolhida a melhor delas. Stevens não era apenas um diretor exigente, mas perfeccionista também.
No que diz respeito à representação do amor das personagens como combustível na trama do enredo do filme, podemos observar o seguinte:
O amor de Joey – Joey (Brandon De Wilde) é um garoto muito esperto para um menino de 12 anos que vive tentando aprender a atirar com sua espingarda de brinquedo, com a qual espanta os animais que se aproximam do rancho. Ele ama a natureza e seus pais. Porém, quando Shane surge com sua austeridade de pistoleiro solitário, este passar a amar seu jeito e modo como o trata e passa a sonhar ser como ele um dia. Na realidade o filme é visto e narrado através do garoto que tanto vê Shane chegar no início, como o vê partir no final.

O amor de Joe Starrett – Joe é um homem rude, mas que ama sua família e sua liberdade para construir uma vida simples e livre. embora no meio de bandidos chacais que
querem seu rancho e sua pequena terra de qualquer jeito.

O amor de Mirriam – Com a chegada de Shane, Mirriam descobre que o amor platônico existe e é mais forte do que ela imaginaria. Uma paixão secreta por Shane surge, independentemente de sua vontade e, em contrapartida, ela procura fugir como pode desse novo sentimento, sem, no entanto poder ocultar de si mesma que não é apenas admiração o que sente por aquele misterioso homem.

O amor de Shane – Shane, um pistoleiro solitário, com algumas mortes nas costas, é um andarilho sem paz. Descobre nessa simples família que um lar, e não uma vida de tiros e mortes, é tudo o que um homem precisa para viver em paz e, para embaralhar mais ainda sua cabeça, descobre que Mirriam seria a mulher que o faria feliz, muito embora o conflito e a consciência de que não pode e nem deve ceder a esse desejo por ela, fale mais alto.

O amor de Ryker, seus homens e do pistoleiro Wilson (Jack Palace) – O amor destes homens, principalmente Wilson era um tipo de amor estranho, era o fascínio pela morte do outro, pois seria anulando o outro que eles conquistavam seus intentos. Entretanto, surgiu Shane para mudar definitivamente a história e evidenciar que a lei do mais forte sempre existiu e continua a imperar. Com isso tudo, o trabalho excepcional de Stevens mostra que, Os Brutos Também Amam...

* Professor do Centro de Biociências da UFRN(juarez@cb.ufrn.br)

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