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2 de ago. de 2008

EU SEI JUDO

Eu sei Judo…
Publicado no Jornal de Hoje, anteriormente
*Juarez Chagas

Como estamos também, vez ou outra, incursionando pelas décadas de 60 e 70, sobre algumas peculiaridades a respeito da turma da Jaguarary e suas “relações contemporâneas” com outros fatos da época, é justo que falemos, pois de alguns acontecimentos interessantes que ocorreram concomitantemente, já que sempre me solicitam juntamente com outros artigos. Não custa atender gentil solicitação.

Recentemente, estive conversando com meu amigo Nilsen Carvalho (este mesmo, que é Vice-reitor de nossa Universidade Federal) e, a propósito por ter sido uma visita quase informal, enquanto conversávamos, relembramos de, pelo menos umas três passagens da época, das quais só vou me reportar sobre uma delas que, por sinal, tem o próprio Nilsen como protagonista.

Mas, antes de falar sobre o assunto, propriamente, normalmente quando nos encontramos, eu lhe digo duas coisas, já de praxe: “Gosto mais de você sem ser Vice-Reitor” e “Rapaz, joga esse cigarro fora...”. E explico as duas frases que ele já tá acostumado ouvir. Primeiro porque, normalmente, queremos privar das amizades de velhos amigos e, por vezes, os eventuais cargos importantes que ocupam, não nos permitem como gostaríamos, o que entendemos muito bem, pois acontecem por força do ofício. E, segundo, no caso especifico, toda vez que o vejo com um cigarro no bico ou entre os dedos, reclamo e chamo sua atenção, para que largue tal vicio que certamente tá acabando com seus pulmões. Pois se ele não o largar, o vicio é que certamente jamais ira deixá-lo.

Bem, voltando ao assunto, Nilsen cursava o curso de Farmácia, na mesma época em que Dilma (sua esposa), a qual é minha colega de turma, cursava Ciências Biológicas, portanto estávamos sempre nos encontrando pelos corredores, festas, jogos universitários, enfim, eventos comuns da turma. Vicente Babosa, nosso ilustre colega que, apesar de sempre ter estado envolvido com a política, também cursava Biologia e, alem da mania de só viver falando em política e, discursando sempre que podia, nesta época arranjou outro assunto, o judô. Pois bem...Vicente, empolgado com sua empresa de segurança, a emserve, inventou de aprender judô e defesa pessoal, juntamente com alguns de seus homens de segurança da empresa.

O fato é que ninguém agüentava mais ouvir Vicente falar em judô pra aqui, judô pra ali, golpe esse, golpe aquele. E um dia ocorreu que Nilsen (este sim, não apenas praticante realmente de judô, porém também competidor e já graduado, senão me falha a memória, em Jodan) estava meio chateado (por razão desconhecida), apesar de não ser uma de suas características, pois quando o mesmo anda calado, é muito mais um observador do que um aborrecido. E Vicente, empolgado com suas novas aulas de judô, porém ainda um neófito nesta arte marcial, não perdia a oportunidade de falar sobre seu novo aprendizado. Nesse dia, nos encontramos, pois, em um dos corredores da antiga Faculdade de Farmácia. Nilsen, por sua vez, tinha ido se encontrar com Dilma, após a aula. Vicente puxou no braço de Nilsen, assim que o viu se aproximar e foi logo dizendo:

- Nilsen, vem cá...ontem eu aprendi um novo golpe de Judô. Meu amigo, esse parece infalível!
Nilsen ficou parado sem dizer uma palavra, fitando Vicente que parecia contente com sua própria narração. Eu, ao lado de ambos, fiquei ouvindo e também observado a cena. Mas, Nilsen não parecia estar gostando de nada do que tava ouvido. E continuava fitando-o serenamente. E Vicente lá, falando sobre o golpe e, como ele finalmente percebera que Nilsen nem se empolgara e nem estava acreditando muito no que ele estava falando (porque até o nome do golpe ele não sabia pronunciar), Vicente por sua vez resolve, repentinamente, tentar demonstrar a técnica no próprio Nilsen. Nilsen, pra quem não o conheceu na época de atleta, parecia gordo (diferente de agora, que realmente é), mas era forte, ou seja, não era gordura e sim músculos que o deixavam atarracado e, diga-se, por sinal, um adversário dificílimo de algum oponente desestabilizar sua base, com um deashi barai, por exemplo. Vicente, não foi muito feliz em sua demonstração, pois segurou na gola da camisa de Nilsen e tentou girar para aplicar um osotogari (que era o nome que ele tentava explicar). Nilsen nem se aluiu do lugar e, imediatamente falou pra Vicente, ao mesmo tempo em que reagiu.

- Por acaso é esse golpe aqui que você tá tentando dar?..(já aplicando o mesmo) Lembro bem que não vi as duas mãos de Nilsen chegar à gola da camisa de Vicente, nem tão pouco vi seu pée direito varrer (deashi barai) suas duas pernas (que estavam juntas, o que um judoca jamais deixaria numa luta), mas sei que vi Vicente ser projetado, voando por cima do ombro de Nilsen e, se estatelar com todo o corpo no piso do corredor. A queda foi um pouco surda porque foi no cimento, mas o grito de Vicente, não. Todo mundo, por ali no prédio da Faculdade de Farmácia, deve ter ouvido.

Pra encurtar a história, dia seguinte, lá vem Nilsen novamente, pegar Dilma na saída da aula, juntamente com toda a turma. Assim que o vi se aproximar, olhei pra Vicente que estava andando todo troncho e entrevado, perguntei:
- Vicente, você por acaso aprendeu algum outro golpe de Judô, ontem à noite? Seu olhar fulminante e de desagrado foi a resposta, enquanto o riso da turma o desconcertou mais ainda.

Terminada a conversa (não essa sobre o episodio, mas sobre o assunto que realmente me fizera procurá-lo na Reitoria), Nilsen me disse:
- Olha, se você contar isso em seus artigos e Vicente não gostar e vier aqui me reclamar...(não o deixei completar a frase e disse):
- Então, a pedido meu, aplique outro osotogari nele, sendo que desta vez do lado esquerdo.

(Apesar da narração estar em forma de artigo, os nomes e o ocorrido não são mera coincidência e o fato é verídico e, mais importante ainda, continuamos todos bons amigos)

* Professor do Centro de Biociencias da UFRN (juarez@cb.ufrn.br)

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